O ‘nabo’ e o ‘craque’ ou a nova história d’O Patinho Feio

O ‘nabo’ e o ‘craque’ ou a nova história d’O Patinho Feio*
Aprendi recentemente, ouvindo outro treinador de basquetebol, que a nossa perceção é a nossa realidade. Numa linguagem simples, os ‘filmes’ que fazemos com a informação que nos chega determinam a nossa visão dos factos e o modo como agimos.
Segundo esse mesmo treinador, hoje em dia, treinar jovens também passa por os ensinar a interpretar essa mesma informação que, como nunca, lhes chega de todos os ângulos, para todos os sentidos e com todo o tipo de intenções.
Existem duas mensagens antagónicas que são atiradas frequentemente aos nossos jovens atletas e para as quais me atrevo a sugerir, aos seus treinadores, que lhes forneçam estes dois (ou outros) ‘filtros’:
1- 'Filtro' para o 'nabo':
Jovens, não acreditem se vos disserem que vocês ‘não jogam nada’, não aceitem que vos digam que ‘nunca vão ser jogadores’. Vocês não crescem todos ao mesmo ritmo. O que vocês conseguem fazer em jogo, hoje, não vos define. O que vos define é:
- o compromisso que vocês tiverem com a vossa aprendizagem e o esforço que estiverem dispostos a fazer para melhorarem a cada dia. É isso que ditará a vossa grandeza como atletas e como pessoas.
2- 'Filtro' para o 'craque':
Jovens, não acreditem quando vos disserem que vocês são ‘grandes jogadores’. No vosso íntimo, não aceitem isso porque não é verdade. Por muitas habilidades que vocês já consigam fazer, isso não vos torna sequer jogadores muito menos ‘grandes jogadores’.
Vai haver sempre gente à vossa volta a dizer-vos isso (a maioria com muito boas intenções) mas nunca (ou raramente) vão ouvir isso do vosso treinador nem de qualquer outro treinador. Desconfiem de um treinador que vos diga o que vocês gostam de ouvir. Não é esse o papel dele.
Isso significa que vocês não devem ser elogiados? Claro que não. Devem ser elogiados quando:
- o compromisso com vocês próprios e com a equipa e o esforço e empenho mostrado em cada momento do treino e do jogo correspondem ao máximo do que vocês são capazes. É isso que ditará a vossa grandeza como atletas e como pessoas.
Temos assim a desdramatização do 'nabo' e a 'desmistificação do 'craque'.
Podem também acrescentar, para ambos os casos, em jeito de conclusão:
Quem quiser ser um atleta, um jogador de basquetebol tem um caminho imenso a percorrer.
Há quem faça esse caminho e chegue a ser jogador de basquetebol. Também há quem não complete essa viagem e não faz mal. Só temos que ser o que nos der felicidade e realização pessoal.
Esse caminho é uma viagem de aprendizagem e construção.
Como todas as viagens o percurso é tão ou mais importante que o destino.
Se este é o vosso sonho e uma das vossas prioridades têm que estar dispostos a ouvir quem está disposto a ensinar-vos, têm que estar dispostos a abdicar do que for um obstáculo ao vosso progresso.
A grande beleza é que isto é válido tanto para o basquetebol como para a escola como para a vossa futura carreira profissional.
Acrescento eu, para treinadores de formação, em jeito de conclusão mas também de apelo à reflexão:
O basquetebol pode ser muito mais do que um jogo. Pode ser um palco onde se ensaiam e estreiam variadas facetas da vida. Pode ser uma ferramenta poderosa no desenvolvimento integral (educativo, lúdico, formativo e social) das crianças e jovens.
*Uma reflexão por José Almeida - treinador português